O primeiro semestre de 2025 marcou a chegada do programa Cozinhas e Infâncias a Curitiba. Professores, gestores e nutricionistas da rede pública de ensino da capital paranaense tiveram a oportunidade de ampliar seus conhecimentos sobre educação alimentar. O projeto já deu frutos, com muitos educadores agregando os saberes a suas práticas pedagógicas.
A educadora Ana Rigo, professora do projeto Mãos na Massa na Escola Professor Erasmo Pilotto, com coordenação pedagógica de Fernanda Ziemmermann, é uma das parceiras do Instituto Comida e Cultura (ICC) na implementação da formação em educação alimentar em Curitiba. Com o apoio do Instituto Bia Rabinovich (IBR), o Cozinhas e Infâncias chegou a educadores de 11 escolas da cidade e, possivelmente, às comunidades de muitas crianças que compartilham os conteúdos das aulas com seus familiares.
O encerramento do curso foi realizado no melhor estilo: junto às crianças, alunas e alunos da escola Erasmo Pilotto. “No Mãos na Massa, trabalhamos alimentação saudável, horta escolar, composteira, meditação, vários aspectos que envolvam o conhecimento sobre os sistemas alimentares e a nossa cultura alimentar brasileira”, conta Ana Rigo.
“Foi muito bonito ver todo mundo trabalhando em conjunto na cozinha, superando as dificuldades. Fiquei bem orgulhosa dos meus alunos. Eles mostraram que já guardam um grande conhecimento sobre educação alimentar e nutricional, fruto de um trabalho de quatro anos que esse projeto já acontece na escola”, completa.

Para Ana Vasconcellos, facilitadora pedagógica do ICC, a experiência em Curitiba partiu de uma construção de parceria, empatia e confiança, tanto com os educadores, quanto com as crianças. “Eu trouxe uma comida originária de alguns países de África, que é o mungunzá, ou a canjica, para a atividade na escola. Falei que a canjica é uma comida de santo, ligada à espiritualidade e à ancestralidade. Que o Brasil tem toda essa cultura preta, cultura indígena e dos imigrantes. Somos um grande país, plural e diferente. Eles ouviram com atenção e contei que a canjica também é memória afetiva, pois a minha mãe faz para mim até hoje”, lembra.

“Depois, cozinhamos juntos e foi muito bacana. Uma das alunas da turma é indígena e nos deu uma aula maravilhosa sobre as comidas típicas do Pará. A gente também aprende muito com eles. Eu mais aprendi do que ensinei, e saí uma pessoa muito melhor depois desse processo.”
Apesar da subjetividade que a educação alimentar pode ter na vida das crianças, o impacto no bem-estar é, muitas vezes, palpável. A seguir, confira alguns depoimentos de estudantes da escola Erasmo Pilotto que fortalecem nossa caminhada por mais educação alimentar nas infâncias.

“Como a gente está em um período em que só comemos comida industrializada, que tem muitos aditivos químicos, o projeto Mãos na Massa é como se fosse um refúgio pras pessoas que querem comer saudável. Pras pessoas que gostam e pras pessoas que não sabem ainda o que é isso. Minha avó e minha mãe sempre cozinham, muito raramente a gente pede uma comida. Às vezes, quando não tem nada pronto para comer, eu vou lá e faço. Porque é uma coisa que a gente já tem idade pra ser independente, para fazer algumas coisas que a gente consegue. E é muito legal descobrir que a gente consegue fazer coisas novas.” – Yasmin, 12 anos (já cozinha desde os 7 anos)
“Desde pequeno, eu sempre quis cozinhar, e comecei no curso esse ano. Já fizemos milho refogado e cozido, pão de mandioca, tapioca, broa de fubá. É divertido cozinhar porque tem gente que eu conheço junto comigo.” – Bernardo, 12 anos

“Acho uma experiência muito legal ter aula de culinária na escola, porque a gente pode aprender a cozinhar umas comidas que podem agregar no nosso dia a dia e no nosso cotidiano. Várias vezes a gente acaba comendo comidas que não fazem bem e a gente acaba não percebendo. Quando a gente faz a nossa própria comida, a gente se sente melhor por ter conseguido fazer. Eu faço macarrão, arroz, feijão, bolo, estrogonofe. Às vezes, cozinho junto com meus irmãos mais novos e ensino a eles.” – Nataly, 14 anos
“Aprendemos bastante sobre comidas indígenas e sobre como o alimento que tem químicos faz mal pra nós. Aprendi a fazer milho cozido, broa de fubá, bolo de fubá também, várias receitas com milho.
Quando você cresce, a mãe não vai estar mais do lado, e você tem que aprender a cozinhar sozinho. Eu conto pra minha família o que eu aprendo na aula. E a minha mãe sempre ensinou a fazer o básico: arroz, feijão.” – Otávio, 12 anos

“Eu vim de Belém do Pará e vivi lá por nove anos, desde que nasci até me mudar para Curitiba. Lá a gente comia bastante tacacá, maniçoba, que são comidas típicas de lá que são feitas principalmente da mandioca e de algumas outras comidas, como o jambu. Eu espero aprender a cozinhar esse tipo de comida um dia.
Aprender a cozinhar é importante para aprender a cultura de outros povos e para que um dia, no futuro, eu possa cozinhar pros meus filhos, pros meus amigos, para familiares. É uma coisa que eu gosto de fazer. Quando eu estou com outras pessoas, eu posso conversar com elas enquanto a gente cozinha, e quando estou sozinha, posso conversar comigo mesma. É um tempinho que eu gosto.
Desde pequena, eu gosto muito de cozinhar com a minha mãe. Só que, quando a gente veio para Curitiba, às vezes a gente não tinha tempo para cozinhar juntos, a família inteira. A gente acabou perdendo algumas coisas que a gente fazia, como cozinhar juntos. Aqui eu encontrei um grupo de pessoas que gostava de cozinhar também, e era muito engraçado, todo mundo ri. E também é sobre conviver com pessoas de outras salas, que a gente não vê durante o intervalo porque a gente já tem nossos amigos e outras coisas para fazer. Mas aí, no Mãos na Massa, eu posso conviver com outras pessoas.” – Maria Clara, 13 anos