Infância em primeiro lugar: da lei ao prato no Dia Mundial da Alimentação

O recado é claro: comemorar a saída do mapa não substitui entregar comida adequada e fresca, todos os dias, para as infâncias brasileiras.
Não faltam políticas, o que falta é fazer junto.
Brasil inspira o mundo em alimentação escolar, agora é hora de dar o próximo passo

Em agosto de 2025, o evento School Meals Coalition (Coalizão para Alimentação Escolar)reuniu representantes de governos, organizações e instituições de mais de uma centena de países. E o Instituto Comida e Cultura estava lá!
Educar sobre comida é educar para a vida: participe da campanha pela Educação Alimentar nas escolas
No Dia Mundial da Alimentação (16 de outubro), o Instituto Comida e Cultura (ICC) lança, junto com o Greenpeace, Instituto Fome Zero, ACT Promoção da Saúde e Instituto de Defesa do Consumidor (Idec), a campanha “A Hora e a Vez da Educação Alimentar” — uma mobilização nacional que convida a sociedade a assinar uma petição online pedindo a implementação efetiva da Educação Alimentar e Nutricional (EAN) nos currículos escolares de todo o país. Então, vaos nessa?! Assine a petição aqui. A Educação Alimentar e Nutricional já é garantida por lei no Brasil desde 2009 (Lei nº 11.947) e reforçada em 2018 (Lei nº 13.666). Mas, na prática, ainda não saiu do papel na maioria das redes de ensino. Ou seja, milhões de crianças e adolescentes seguem sem acesso a conteúdos que os ajudem a compreender de onde vem a comida que consomem, quais são seus direitos e como fazer escolhas mais saudáveis e sustentáveis. “Temos uma legislação avançada, que reconhece a Educação Alimentar como um direito. Mas falta vontade política para tirá-la do papel. Enquanto isso, vemos crianças cada vez mais expostas à publicidade de ultraprocessados, sem acesso a informações críticas sobre alimentação — e isso precisa mudar”, afirma Ariela Doctors, coordenadora geral do Instituto Comida e Cultura. Dia Mundial da Alimentação: um dia de luta O lançamento da campanha no Dia Mundial da Alimentação reforça a urgência de garantir uma política pública que una educação, cultura alimentar, sustentabilidade e cidadania.Isso porque, em um cenário marcado pela sindemia global (conceito que explica o entrelaçamento da obesidade, da desnutrição e das mudanças climáticas), a EAN se apresenta como uma estratégia essencial para enfrentar as desigualdades e fortalecer o direito à alimentação adequada e saudável desde a infância. “A educação alimentar e nutricional pode ser uma estratégia de integração dos componentes curriculares, enriquecendo a aprendizagem e desenvolvendo senso crítico quanto às escolhas alimentares”, destaca Giorgia Russo, especialista do Idec. Inclusive, esta campanha é fruto de uma articulação inédita entre organizações da sociedade civil comprometidas com a soberania alimentar e a educação. O ICC, ao lado de suas alianças, reforça o convite para que educadores, governos e cidadãos se engajem nessa pauta.Educar sobre comida é educar para a vida — e garantir a Educação Alimentar nas escolas é formar gerações mais conscientes, saudáveis e críticas. Educar sobre comida é educar para a vida. Garantir a Educação Alimentar nas escolas é formar gerações mais conscientes, saudáveis e críticas. Junte-se a nós nessa mobilização!
4 conteúdos inspiradores para trabalhar a Educação Alimentar nas escolas

O Dia dos Professores é uma oportunidade para reconhecer e agradecer a toda a rede que circunda a educação de uma criança. Entre tantas dimensões do processo educativo, a alimentação ocupa um lugar fundamental, já que colabora com a formação do ser humano e nos garante uma forma de estar no mundo. Falar sobre o que comemos é também refletir sobre como vivemos, de onde vêm nossos alimentos e quais relações construímos com a terra, com o outro e com a cultura. Por isso, reunimos cinco conteúdos inspiradores para educadores que desejam trabalhar a Educação Alimentar e Nutricional (EAN) de forma transversal e crítica, reconhecendo a comida como um eixo potente de aprendizagem, pertencimento e cidadania. Então, vamos à lista?! 1. Cozinhas & Infâncias — Guia Orientador de educação alimentar e nutricional nas escolas municipais de Chapada dos Guimarães Esse guia foi construído a partir de conversas com as professoras participantes da segunda fase do Programa Cozinhas & Infâncias, promovido pelo Instituto Comida e Cultura com apoio do Ministério Público Estadual e em parceria com a Secretaria Municipal de Educação de Chapada dos Guimarães. Ele visa indicar alternativas possíveis para a implementação de ações transversais para Educação Alimentar e Nutricional (EAN) nas escolas municipais de Chapada dos Guimarães, Mato Grosso. O Guia pretende fomentar ecossistemas de aprendizagens com a ampliação da participação das famílias, escolas, gestores e das comunidades, em busca da promoção da alimentação adequada e saudável nos territórios, ressaltando uma agenda de atividades que valorizem as diferentes expressões da cultura alimentar, fortaleçam hábitos regionais e as dimensões relacionadas a uma comunidade sustentável. Acesse o material completo aqui. 2. Referencial de Educação Alimentar e Nutricional nas Escolas (Rebrae) Elaborado pela Rede Brasileira de Alimentação e Nutrição Escolar (Rebrae), este documento recente apresenta diretrizes, fundamentos teóricos e exemplos práticos de como incluir a EAN nos currículos escolares. É uma leitura essencial para gestores, educadores e profissionais que buscam alinhar suas práticas às políticas públicas de alimentação e nutrição. Acesse o referencial completo. 3. Educação Alimentar e Nutricional – Orientações pedagógicas (Prefeitura de São Paulo) Material dedicado às educadoras e aos educadores com percurso de reflexões sobre a alimentação escolar, que atravessa o tempo e se consolida na sociedade brasileira como direito fundamental de bebês, crianças e estudantes. O intuito da publicação é aliar os estudos sobre alimentação e nutrição nos momentos coletivos de formação, planejamento e replanejamento dos Projetos Político-Pedagógicos. Baixe gratuitamente aqui. 4. Playlist no Youtube – CODAE-SP Essa lista, organizada pelo CODAE-SP, reúne uma série de vídeos curtos e inspiradores sobre o universo da alimentação, da produção ao consumo, passando por temas como cultura alimentar, sustentabilidade e segurança alimentar. É um ótimo material de apoio para professores que queiram enriquecer suas aulas com conteúdos acessíveis e multimídia, ajudando estudantes a refletirem sobre o papel da comida em nossas vidas, nas cidades e no planeta. Acesse a playlist no Youtube do CODAE. Por fim, ao incluir a Educação Alimentar e Nutricional nas escolas, ampliamos o horizonte da aprendizagem e reafirmamos o direito à comida de verdade como parte indissociável do direito à educação. Esperamos que o material seja útil em muitas escolas brasileiras!
A hora e a vez da Educação Alimentar e Nutricional: Seminário foi marcado por um convite à mobilização

Saiba como foi o evento que aconteceu no Instituto de Estudos Avançados da USP
Policy Brief defende Educação Alimentar nas escolas como resposta às epidemias de obesidade e mudanças climáticas

O Instituto Comida e Cultura (ICC) lança manifesto que defende a Educação Alimentar e Nutricional (EAN) como política pública estruturante.
Instituto Comida e Cultura e IEA promovem seminário sobre Educação Alimentar e Nutricional na USP

Evento discute o papel estratégico da Educação Alimentar frente à crise climática, às desigualdades sociais e à desinformação No dia 11 de agosto, acontece o seminário “A Hora e a Vez da EAN”, realizado a partir de uma parceria entre o Instituto Comida e Cultura (ICC) e o Instituto de Estudos Avançados (IEA) da USP. O evento, que também conta com o apoio da Cátedra Alfredo Bosi de Educação Básica da USP, tem como objetivo posicionar a Educação Alimentar e Nutricional (EAN) no centro dos debates sobre educação, cultura alimentar, saúde e justiça social. Com painéis e bate-papos entre especialistas para discutir políticas públicas, práticas educativas e o papel da alimentação na promoção da equidade e cidadania, a atividade acontece entre 14h e 18h, no IEA-USP, na Cidade Universitária, com transmissão ao vivo pelo YouTube. “O evento marca uma articulação potente entre sociedade civil, academia e poder público para fortalecer a educação alimentar e nutricional como prática contínua nas escolas e como política pública de impacto intersetorial. Queremos ampliar essa conversa, sensibilizar gestores e apoiar educadores na construção de uma agenda positiva e transformadora na garantia do Direito Humano à Alimentação Adequada”, comenta Patrícia Jaime, vice-diretora da Faculdade de Saúde Pública da USP e pesquisadora do IEA. Durante o seminário, será lançado o manifesto “A Hora e a Vez da Educação Alimentar”, documento que defende a EAN como política pública estruturante no contexto de sindemia global, que descreve a interseção de múltiplas epidemias como a obesidade, a desnutrição, as doenças crônicas não transmissíveis e as mudanças climáticas. O documento também apresenta sete recomendações aos gestores públicos para implementação efetiva da EAN nas escolas. Consulte o material completo aqui. O encontro é direcionado a profissionais de educação, saúde e assistência social e agricultura, além de professores, estudantes de graduação e pós-graduação, pesquisadores, gestores públicos e representantes de movimentos sociais e da sociedade civil organizada.
Seminário Cozinhas e Infâncias promove encontro sobre educação alimentar e a cultura do Cerrado em Chapada dos Guimarães

Por Flora Camargo e Solène Tricaud Chapada dos Guimarães é um município mato-grossense conhecido por seus aspectos turísticos e belezas naturais. O que deveria chamar a atenção, para além disso, é que este é um município majoritariamente rural, com áreas de cerrado preservado, onde comunidades vivem e mantêm muita riqueza, saberes e diversidade, e dependem deste bioma. Passados três anos de atuação do Instituto Comida e Cultura, por meio do programa Cozinhas e Infâncias Territórios, construímos um seminário de culminância que pretendeu trazer luz ao tema e celebrar as ações desenvolvidas neste tempo e neste território. Um trabalho em conjunto a diversas escolas urbanas e rurais do município e olhando junto com a comunidade escolar para a transformação que a Educação Alimentar e Nutricional (EAN) pretende imprimir no território. Para saber mais sobre o progama Cozinhas e Infâncias Territórios e sobre essa primeira experiencia no Mato Grosso, sugerimos a leitura deste outro artigo, em noso blog. O seminário “Cozinhas & Infâncias: Educação e Alimentação Escolar no Cerrado”, aberto à população local, recebeu diversas comunidades rurais e a comunidade escolar, que participaram oferecendo deliciosos e surpreendentes quitutes feitos com ingredientes locais, ao longo da programação deste evento, que celebrou também a inserção do pequi e do baru na Chamada Pública da alimentação escolar do município. Durante a manhã, as participantes da formação puderam apresentar os projetos realizados ao longo do semestre, no chão da escola. Foram trazidos temas como: o resgate das plantas medicinais locais e a confeção de produtos como sabonetes, xaropes, entre outros; inovação em compostagem e minhocário; comida afetiva e a participação das famílias na escola; resgate de alimentos na alimentação escolar como o inhame; sementes e preservação do Cerrado; atividades lúdicas e alimentação adequada e saudável; implantação de hortas escolares; pães caseiros, e outros. Os projetos foram apresentados evidenciando mudanças positivas, tendo sido realizados com ferramentas que permitiram autonomia e permanência das ações na rotina escolar, estreitando laços, promovendo saberes e sabores diversos e fortalecendo a Educação Alimentar como tema potente, transversal e de transformação social. Ao longo de todo evento, pudemos contar com uma feira com expositores de diversas comunidades rurais do município ligadas à comunidade escolar. Uma oportunidade para dar visibilidade e valorizar as agricultoras e os agricultores familiares e suas associações, além de artesãs e artesãos chapadenses, trazendo grande riqueza e diversidade de produtos. Isso demonstra a força de organização e potência destes territórios, e se fizeram presentes as comunidades Batatais, Jangada Roncador, Pedra Preta, Água Fria, Mamede e o Vale do Jamacá, trazendo uma grande riqueza de produtos, como: mandioca e derivados (farinha, biscoitos, chips), doces, geleias, ovos, queijo, requeijão, pães, biscoitos, assim como frutas, hortaliças e legumes, sabonetes, xaropes, além de produtos oriundos do manejo sustentável do cerrado como o pequi e os derivados do cumbaru e jatobá. Como forma de garantir a participação ampla da comunidade escolar, o seminário contou com atividades específicas voltadas às crianças. Elas também mergulharam no tema da alimentação, de forma leve e lúdica a partir de desenhos, pinturas, sessão de filme e colheita na horta escolar agroecológica de verduras e ervas medicinais. O evento contou ainda com a performance “Pilão”, realizada pelo grupo de mulheres da comunidade Barra do Bom Jardim que, por meio da dança, da fala e do gesto de socar o arroz no pilão, compartilharam as lembranças da vida na roça e dos modos de fazer nas comunidades rurais antes do alagamento de parte do território Chapadense para a construção da Usina Hidrelétrica do Manso. Esse parêntese artístico-cultural no meio do seminário trouxe memórias à tona e descobertas para quem nunca havia visto arroz com casca, ou o trabalho no pilão, provocando reflexões sobre as mudanças que impactam nossos pratos e nossa alimentação diária. Encerramos o seminário com uma roda de conversa com agentes do Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE), que estabelece a participação da comunidade no controle social, no acompanhamento das ações realizadas pelos municípios para garantir a oferta da alimentação escolar saudável e adequada. Estiveram presentes a Secretária Municipal de Cultura, a Empresa Mato-grossense de Pesquisa, Assistência e Extensão Rural (EMPAER), o Conselho de Alimentação Escolar (CAE), o Centro Colaborador em Alimentação e Nutrição Escolar (CECANE), a Associação Jovens Vivendo no Campo e a Cooperativa Agropecuária dos Produtores Rurais de Chapada dos Guimarães (Cooperchapada). Foi um momento importante para expressar observações e sugestões sobre os caminhos e os desafios enfrentados no fornecimento da alimentação escolar no município, além de celebrar o PNAE, seus princípios e desdobramentos a partir da formação. Como parte da contribuição deste encontro, destacamos alguns pontos importantes para entender o que pode ser melhorado a partir de uma carta manifesto escrita ao longo da formação em conjunto com a comunidade escolar e aproveitamos a oportunidade para pensarmos juntos em soluções. Por fim, realizamos o plantio de uma muda de baru celebrando os frutos gerados por este simbólico evento, estabelecendo a prática de EAN como ferramenta de fortalecimento da cultura local, resgatando e valorizando as tradições alimentares e a identidade dos povos habitantes do cerrado mato-grossense. Agradecemos os seguintes coletivos e seus membros pela participação no evento: Associação Jovens Vivendo no Campo, Associação dos pequenos produtores da Jangada Roncador, Associação de moradores e pequenos produtores do PA Mamede, Associação de pequenos produtores rurais da cachoeira e Morro do Bom Jardim, grupo Produzir Chapada, Empreendimento DuCampo e Sítio Jamacá. Agradecemos às intérpretes-criadoras da performance cultural “Pilão”: Dona Sofia de Alvarenga, Laura de Alvarenga, Lory Silva e Francisca Dias Lessa — moradoras da Comunidade Barra do Bom Jardim, e Oz Ferreira, dramaturgista e diretora da cena. Agradecemos ao Grupo Semente e ao Projeto Sementinha por abrir as portas da horta em que aconteceram as oficinas com as crianças. Agradecemos a CMEI Anita Goulart, a escola Municipal Monteiro Lobato e as Escolas Rurais Municipais Santa Helena e Elba Xavier e suas anexas. Agradecemos também a escola estadual Rafael de Siqueira em nome do seu diretor Daniel de Lima, que gentilmente cedeu o espaço para a realização do Seminário.
Programa Cozinhas e Infâncias celebra formatura em Curitiba com a juventude na cozinha

O primeiro semestre de 2025 marcou a chegada do programa Cozinhas e Infâncias a Curitiba. Professores, gestores e nutricionistas da rede pública de ensino da capital paranaense tiveram a oportunidade de ampliar seus conhecimentos sobre educação alimentar. O projeto já deu frutos, com muitos educadores agregando os saberes a suas práticas pedagógicas. A educadora Ana Rigo, professora do projeto Mãos na Massa na Escola Professor Erasmo Pilotto, com coordenação pedagógica de Fernanda Ziemmermann, é uma das parceiras do Instituto Comida e Cultura (ICC) na implementação da formação em educação alimentar em Curitiba. Com o apoio do Instituto Bia Rabinovich (IBR), o Cozinhas e Infâncias chegou a educadores de 11 escolas da cidade e, possivelmente, às comunidades de muitas crianças que compartilham os conteúdos das aulas com seus familiares. O encerramento do curso foi realizado no melhor estilo: junto às crianças, alunas e alunos da escola Erasmo Pilotto. “No Mãos na Massa, trabalhamos alimentação saudável, horta escolar, composteira, meditação, vários aspectos que envolvam o conhecimento sobre os sistemas alimentares e a nossa cultura alimentar brasileira”, conta Ana Rigo. “Foi muito bonito ver todo mundo trabalhando em conjunto na cozinha, superando as dificuldades. Fiquei bem orgulhosa dos meus alunos. Eles mostraram que já guardam um grande conhecimento sobre educação alimentar e nutricional, fruto de um trabalho de quatro anos que esse projeto já acontece na escola”, completa. Para Ana Vasconcellos, facilitadora pedagógica do ICC, a experiência em Curitiba partiu de uma construção de parceria, empatia e confiança, tanto com os educadores, quanto com as crianças. “Eu trouxe uma comida originária de alguns países de África, que é o mungunzá, ou a canjica, para a atividade na escola. Falei que a canjica é uma comida de santo, ligada à espiritualidade e à ancestralidade. Que o Brasil tem toda essa cultura preta, cultura indígena e dos imigrantes. Somos um grande país, plural e diferente. Eles ouviram com atenção e contei que a canjica também é memória afetiva, pois a minha mãe faz para mim até hoje”, lembra. “Depois, cozinhamos juntos e foi muito bacana. Uma das alunas da turma é indígena e nos deu uma aula maravilhosa sobre as comidas típicas do Pará. A gente também aprende muito com eles. Eu mais aprendi do que ensinei, e saí uma pessoa muito melhor depois desse processo.” Apesar da subjetividade que a educação alimentar pode ter na vida das crianças, o impacto no bem-estar é, muitas vezes, palpável. A seguir, confira alguns depoimentos de estudantes da escola Erasmo Pilotto que fortalecem nossa caminhada por mais educação alimentar nas infâncias. “Como a gente está em um período em que só comemos comida industrializada, que tem muitos aditivos químicos, o projeto Mãos na Massa é como se fosse um refúgio pras pessoas que querem comer saudável. Pras pessoas que gostam e pras pessoas que não sabem ainda o que é isso. Minha avó e minha mãe sempre cozinham, muito raramente a gente pede uma comida. Às vezes, quando não tem nada pronto para comer, eu vou lá e faço. Porque é uma coisa que a gente já tem idade pra ser independente, para fazer algumas coisas que a gente consegue. E é muito legal descobrir que a gente consegue fazer coisas novas.” – Yasmin, 12 anos (já cozinha desde os 7 anos) “Desde pequeno, eu sempre quis cozinhar, e comecei no curso esse ano. Já fizemos milho refogado e cozido, pão de mandioca, tapioca, broa de fubá. É divertido cozinhar porque tem gente que eu conheço junto comigo.” – Bernardo, 12 anos “Acho uma experiência muito legal ter aula de culinária na escola, porque a gente pode aprender a cozinhar umas comidas que podem agregar no nosso dia a dia e no nosso cotidiano. Várias vezes a gente acaba comendo comidas que não fazem bem e a gente acaba não percebendo. Quando a gente faz a nossa própria comida, a gente se sente melhor por ter conseguido fazer. Eu faço macarrão, arroz, feijão, bolo, estrogonofe. Às vezes, cozinho junto com meus irmãos mais novos e ensino a eles.” – Nataly, 14 anos “Aprendemos bastante sobre comidas indígenas e sobre como o alimento que tem químicos faz mal pra nós. Aprendi a fazer milho cozido, broa de fubá, bolo de fubá também, várias receitas com milho. Quando você cresce, a mãe não vai estar mais do lado, e você tem que aprender a cozinhar sozinho. Eu conto pra minha família o que eu aprendo na aula. E a minha mãe sempre ensinou a fazer o básico: arroz, feijão.” – Otávio, 12 anos “Eu vim de Belém do Pará e vivi lá por nove anos, desde que nasci até me mudar para Curitiba. Lá a gente comia bastante tacacá, maniçoba, que são comidas típicas de lá que são feitas principalmente da mandioca e de algumas outras comidas, como o jambu. Eu espero aprender a cozinhar esse tipo de comida um dia. Aprender a cozinhar é importante para aprender a cultura de outros povos e para que um dia, no futuro, eu possa cozinhar pros meus filhos, pros meus amigos, para familiares. É uma coisa que eu gosto de fazer. Quando eu estou com outras pessoas, eu posso conversar com elas enquanto a gente cozinha, e quando estou sozinha, posso conversar comigo mesma. É um tempinho que eu gosto. Desde pequena, eu gosto muito de cozinhar com a minha mãe. Só que, quando a gente veio para Curitiba, às vezes a gente não tinha tempo para cozinhar juntos, a família inteira. A gente acabou perdendo algumas coisas que a gente fazia, como cozinhar juntos. Aqui eu encontrei um grupo de pessoas que gostava de cozinhar também, e era muito engraçado, todo mundo ri. E também é sobre conviver com pessoas de outras salas, que a gente não vê durante o intervalo porque a gente já tem nossos amigos e outras coisas para fazer. Mas aí, no Mãos na Massa, eu posso conviver com outras pessoas.” – Maria Clara, 13 anos
Educação Alimentar e Nutricional: uma resposta sistêmica à sindemia global

Artigo de Ariela Doctors e Brena Barreto Você já ouviu falar em sindemia? Esse termo está relacionado aos desafios que enfrentamos atualmente na saúde pública, principalmente quando falamos de alimentação, doenças crônicas e mudanças climáticas. Ele também nos ajuda a entender por que a Educação Alimentar e Nutricional (EAN), a Educação Sistêmica, e a Educação Ambiental são necessárias, principalmente na infância. O conceito de sindemia global descreve a interação entre três crises contemporâneas: obesidade, desnutrição e mudanças climáticas¹. Elas coexistem e se potencializam, compartilhando as mesmas causas, como sistemas alimentares insustentáveis e desigualdades sociais. Seus efeitos não são iguais para todas as populações, afetando desproporcionalmente grupos mais vulneráveis, como as crianças. Os efeitos da sindemia global na infância A má alimentação na infância, seja por excesso ou por deficiência de nutrientes, pode comprometer o crescimento físico e o desenvolvimento cognitivo ao longo da vida. Milhões de crianças em todo o mundo enfrentam simultaneamente as diferentes formas de má nutrição (como desnutrição, obesidade e deficiências nutricionais), em um contexto marcado pelo aumento do consumo de alimentos ultraprocessados. Esses produtos, estão associados a um maior risco de obesidade e outras doenças crônicas não transmissíveis². Somam-se a esse quadro os efeitos dos eventos climáticos extremos, como enchentes e secas, que impactam a produção de alimentos, dificultando o acesso a alimentos frescos e nutritivos. Crianças que vivem em comunidades de baixa renda e em zonas rurais estão entre as mais impactadas por essa realidade³. Diante dessa complexidade, precisamos de respostas que não se limitem a soluções pontuais ou técnicas. É nesse cenário que a EAN, aliada à Educação Ambiental e à Educação Sistêmica, se torna uma estratégia transformadora. Educação Sistêmica: enxergar as conexões A Educação Sistêmica propõe olhar o mundo de forma integrada4. Em vez de tratar saúde, alimentação, meio ambiente e cultura como temas separados, ela reconhece as interconexões entre eles. Essa abordagem convida escolas a integrarem saberes, territórios e afetos, promovendo uma aprendizagem significativa e comprometida com a vida. Quando aplicada à EAN, a visão sistêmica permite entender que comer não é apenas uma necessidade biológica, mas um ato cultural, político, ambiental e relacional. Ao desenvolver esse olhar nas crianças e jovens, a escola contribui para formar cidadãos conscientes do seu papel na transformação do mundo. A escola como espaço de transformação No Brasil, a Lei nº 11.947/2009 fortaleceu o Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE)5, garantindo refeições saudáveis na escola e incentivando a compra de alimentos da agricultura familiar. Com a Lei nº 13.666/2018, a EAN passou a fazer parte do currículo escolar, reafirmando seu papel na formação integral. Mas a educação alimentar não se resume a conteúdos sobre nutrientes. Na prática, ela se manifesta em hortas pedagógicas, oficinas de culinária, rodas de conversa, visitas a feiras, projetos sobre agroecologia. Tudo isso ajuda os estudantes a refletirem: o que comemos? De onde vem? Como é produzido? Quem lucra e quem perde nesse processo? Educação alimentar e ambiental: o mesmo caminho A crise ambiental e alimentar têm uma raiz comum: um sistema que desrespeita os ciclos da natureza, os saberes tradicionais e os direitos humanos. Produção intensiva, uso de agrotóxicos, desperdício e emissão de gases de efeito estufa fazem da alimentação um dos principais vetores da destruição ambiental. Por isso, Educação Alimentar e Ambiental precisam andar juntas — e de forma sistêmica. Ao trabalhar com os estudantes os impactos do consumo alimentar, a valorização da cultura local, a importância da sociobiodiversidade e o respeito à terra, a escola contribui para uma mudança de consciência que se traduz em atitudes. Comer é um ato político e relacional Inspirada em Paulo Freire6, a EAN defende o diálogo, a escuta e a valorização das experiências alimentares dos sujeitos. Comer é um ato político, afetivo e identitário. É também um ato de pertencimento: ao corpo, à comunidade, ao território.Frente à sindemia global, uma educação com visão sistêmica é mais do que necessária — é urgente. Ela nos ajuda a compreender o mundo como uma teia de relações vivas, e nos convida a agir com consciência, responsabilidade e empatia.Educar para comer melhor é, também, educar para ser, conviver, transformar, reconhecer e defender direitos. E esse caminho pode começar no cotidiano das escolas! REFERÊNCIAS Sobre as autoras Ariela Doctors é coordenadora-geral e coautora dos processos pedagógicos do Instituto Comida e Cultura, é comunicadora, escritora e chef de cozinha. Membro do Conselho Educação e Território do Instituto Aprendiz, tem ampla experiência em educação sistêmica e cursa mestrado em Nutrição em Saúde Pública na USP. Brena Barreto Barbosa é pesquisadora e mentora do Sustentarea. É Mestra em Nutrição e Saúde pela Universidade Estadual do Ceará.