Por Ariela Doctors, coordenadora geral do Instituto Comida e Cultura
Em agosto de 2025, tive a alegria de participar, junto com Erika Fischer, representando o Instituto Comida e Cultura (ICC), do encontro da School Meals Coalition (Coalizão para Alimentação Escolar), em Fortaleza. O evento reuniu representantes de governos, organizações e instituições de mais de uma centena de países, especialmente do Sul Global, todos com um mesmo propósito: garantir que nenhuma criança vá à escola com fome, e que a alimentação escolar seja cada vez mais um instrumento de educação, saúde e equidade.
Foi emocionante perceber, mais uma vez, como o Brasil é referência mundial nessa agenda. O Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE) é um orgulho que ultrapassa fronteiras. Criado há 70 anos, ele continua a inspirar políticas públicas em todo o mundo, não apenas pelo alcance (são mais de 40 milhões de estudantes atendidos todos os dias), mas por algo que vai muito além: a integração entre educação, nutrição, agricultura familiar, justiça social e climática.
Durante o encontro, tivemos acesso em primeira mão ao resumo executivo do relatório “O Estado da Alimentação Escolar no Mundo em 2024 ”, produzido pelo Programa Mundial de Alimentos (WFP). O documento traz uma notícia que merece ser celebrada: quase 80 milhões de crianças a mais passaram a ser beneficiadas pelos programas nacionais de alimentação escolar nos últimos quatro anos. No total, são agora 466 milhões de crianças alcançadas no planeta! Um avanço histórico que mostra o poder da cooperação entre países.
Sobre a School Meals Coalition (Coalizão para Alimentação Escolar)
A School Meals Coalition, hoje com 108 países membros, se consolida como uma das iniciativas multilaterais mais bem-sucedidas e proativas do período pós-pandemia. E é bonito ver o Brasil nesse centro de referência, mostrando que políticas públicas consistentes e participativas podem transformar realidades.
Nos últimos anos, o PNAE avançou de forma significativa. Além de reafirmar o compromisso com uma alimentação adequada e saudável, o programa incorporou novas diretrizes: redução de ultraprocessados nas escolas e aumento da compra da agricultura familiar de 30% para 45%, garantindo que os alimentos que chegam ao prato das crianças também sustentem famílias agricultoras e comunidades locais.
São conquistas fundamentais, mas sabemos que ainda há o que aprimorar. O valor per capita destinado à alimentação escolar precisa ser revisto, para garantir que essa política siga sendo de qualidade e alcance em todas as escolas, desde a primeira infância. E é também hora de irmos além do prato.
A Hora e a Vez da Educação Alimentar e Nutricional (EAN)
O próximo passo, e talvez o mais transformador, é fortalecer a Educação Alimentar e Nutricional (EAN) como parte viva dos currículos escolares. O Brasil já tem base legal para isso, com a Lei 13.666/2018 e o decreto presidencial de 2023 que reforça a integração da EAN nas políticas de educação básica. Esse é um terreno fértil para inovar. Afinal, não basta alimentar os corpos, é preciso também formar consciências, conectar crianças, educadores e comunidades ao sentido profundo do comer bem, cuidar do ambiente e valorizar a cultura alimentar local.
No Instituto Comida e Cultura, acreditamos que essa é a tênue fronteira para transformação: unir alimentação escolar e educação alimentar de forma sistêmica e emancipatória. Isso significa ampliar o diálogo entre MEC e FNDE, promover a formação continuada de educadores, cozinheiras, nutricionistas e gestores, e incorporar a EAN de maneira interdisciplinar e efetiva nos currículos e planos político-pedagógicos das escolas.
Uma escola que ensina sobre comida traz pro visível aquilo que foi em algum momento afastado do saber. Ter o alimento como fio condutor dentro da educação possibilita que o estudante se reconecte aos processos, ao fazer, ao sentir e a compreensão de como o mundo funciona.
Ao sairmos do encontro em Fortaleza, ficou clara uma certeza: o Brasil tem muito a ensinar e também muito a aprender com essa rede global que está redesenhando o papel da alimentação escolar. É um movimento que une o direito humano à alimentação adequada ao direito de aprender.
E é nisso que acreditamos: alimentar é um ato político, educativo, cultural e pode ainda, ser revolucionário. Quando a escola assume esse papel, ela não apenas mata a fome, ela semeia a transformação de paradigmas e espalha abundância, no lugar da escassez.
PARTICIPE DA NOSSA CAMPANHA
Agora é hora de transformar essa visão em política viva. A Educação Alimentar e Nutricional precisa deixar de ser um tema lateral e se tornar um eixo estruturante das escolas públicas e privadas no Brasil. Isso exige vontade política, investimento e mobilização social. Por isso, o Instituto Comida e Cultura convida todas e todos que acreditam no poder da comida como instrumento de emancipação a se juntar a nós. Assine e divulgue a petição da campanha “A Hora e a Vez da EAN”, este é um passo concreto para que o Brasil siga inspirando o mundo, com políticas que alimentam corpos, mentes e presentes mais justos, saudáveis e possíveis!